O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE E O CAOS NAS ESCOLAS
Há sempre gente disposta a apropriar-se do debate para redirecionar o discurso em prol de determinado assunto ou causa. Há quem o faça por maldade, mas também há que faça mesmo por defeito ou vício, quase inconscientemente. Às vezes isso até traz algo de novo, acrescentando diferentes visões sobre a discussão, outras vezes nem por isso.
Os episódios de violência física decorridos em diferentes escolas, no início desta semana, onde um professor agrediu um aluno, e noutros dois casos onde familiares e alunos agrediram auxiliares e professores em diferentes escolas, são exemplo disso mesmo. Houve muitas posições sobre as diversas atitudes dos envolvidos, houve discursos sobre a impunidade, levantou-se a questão étnica e racial, criticaram-se o Estado, o governo e o estado em que está a educação no país, como um todo. Pelo meio, quem tentasse restringir a questão ao estritamente legal, era fuzilado.
Embora todos estes temas sejam, de facto, questões de suma importância e que devem ser debatidas e discutidas, não só em prol do funcionamento das escolas, como também pela importância delas na sociedade, não é possível partir para este debate ignorando o seu enquadramento legal.
Num Estado de Direito, regido pelos princípios constitucionais, toda a base legal obedece, entre outros, ao Princípio da Legalidade. Que é, grosso modo (e no campo teórico há muitas visões díspares), o que define que enquanto os cidadãos podem fazer tudo aquilo que não é proibido, a atuação da Administração Pública está restrita ao que está previsto em lei. Por isso, sempre que um funcionário público age à margem desta, extrapolando a tipicidade das suas funções, está a cometer crime de abuso de poder. Algo que é mais do que um ato ilícito, é também um crime contra a sociedade.
Então, é natural que a gestão pública seja obrigada a agir de forma célere, responsável e ativa perante qualquer tipo de atrocidade ou abuso deste género. Seja por parte de um professor em sala de aula, ou de um polícia nas ruas, ou de qualquer funcionário que no exercício das suas funções representa o Estado, tendo por isso a dupla responsabilidade de agir em conformidade com as suas atribuições, obrigações e deveres.
Entendidos sobre isso, aí sim devemos partir para o debate sobre as condições de insalubridade que podem ser encontradas em diversas escolas; ou sobre a pressão moral e psicológica que hoje recai sobre os professores; ou sobre a incapacidade das autoridades e do poder político em lidarem com a violência associada às minorias étnicas; ou até mesmo sobre a impunidade daqueles que praticam e promovem atos de violência, seja de forma institucionalizada ou à margem do vazio que existe dentro do sistema de ensino, incapaz de lidar com as diferentes circunstâncias e contextos sociais que nele se tentam encaixar. Sempre e desde que isso não seja motivo para desvirtuar o assunto ou para justificar o injustificável.
Pois, a defesa de melhores condições de trabalho, garantias, reconhecimento e direitos dos profissionais de qualquer setor parte também deste princípio onde se regula a sua atividade, condenando qualquer ato atípico. Até porque, é importante sublinhar o caos a que os professores são submetidos em muitos casos, sem qualquer amparo, defesa ou salvaguarda.