MISTER, NÓS TE AMAMOS!
Pouco importa se Jorge Jesus não sabe fazer contas. Depois de falhar eliminatórias aos 88 minutos e de perder finais e campeonatos aos 92 minutos, foi precisamente nesses minutos que o Flamengo conseguiu empatar um jogo perdido e vencer uma final histórica da Libertadores, precisamente no mesmo dia em que há 38 anos (23 de nov. de 1981) tinha conquistado a primeira taça. Nem ele seria capaz de prever tal desfecho, com uma narrativa digna dos melhores suspenses do cinema.
Eu que várias vezes critiquei os erros de Jorge Jesus, que por algumas vezes se deixou dominar por uma narrativa egocêntrica e displicente, onde se colocava acima das equipas e respetivas comissões técnicas, tenho que reconhecer que alguma coisa mudou. Ao contrário de outros momentos, no Benfica e no Sporting, onde a vaidade impediu Jesus de se adaptar e de aprender com os erros, hoje ela parece ter dado lugar à lucidez e ao espírito coletivo de grupo, onde a equipa e os jogadores formam um grupo coeso, em prol de um objetivo comum. Jesus, mister, professor, o tuga que mudou muitas coisas no futebol brasileiro e sul-americano, também mudou com o Brasil e os brasileiros. Acolhido em ombros pelos adeptos do mengão, ele ainda dedicou o título aos portugueses que o apoiaram nesta final (como eu). Em vez de dividir, JJ resolveu unir e amar.
Não foi só Jorge Jesus que acrescentou algo ao futebol brasileiro. O Brasil também ajudou a mudar o homem que dá um beijo a cada jogador antes e depois de cada jogo. Jesus foi de Cristo Rei a Cristo Redentor.
Em poucos meses conseguiu tudo na Libertadores e no Brasileirão. Ultrapassou o Palmeiras de Scolari (que foi demitido) e criou um fosso entre si e os adversários. Todos dizem que tem "o melhor futebol do campeonato". Ganhou o campeonato sem sequer entrar em campo. É histórico, num campeonato onde os treinadores se queixam de falta de tempo, ele conseguiu pegar numa equipa em andamento e conquistar as duas competições mais importantes. Além disso, bateu ou atingiu todo o tipo de recorde, como número de vitórias, golos marcados, número de pontos, melhor marcador. Falta o Campeonato do Mundo... Agora, todos querem ser Jesus.
Porém, ao contrário de outros momentos em que Jesus e as suas equipas se renderam à euforia, desta vez o mister tem feto jus aos seus lemas e ensinamentos: "eu vou ensinar-vos a ganhar nos 88 minutos" em que os jogadores não têm a bola nos pés, e "para ganhar, primeiro, é preciso estar lá". E ele tem estado, pedindo paciência e calma aos seus, porque "já perdi finais a 10 segundos do final". Hoje, pouco importa se foram 17 ou 16, 10 ou só 1. O que importa é que a experiência e o conhecimento táctico, técnico e profissional, humano e social, abriram os céus ao Jorge da Amadora, que hoje levou o carnaval ao Rio de Janeiro. Pois, como já se diz, "se Deus é brasileiro, Jesus é português", rubro negro e da favela, que vibra com o mengão. "É o melhor técnico do mundo", dizem os adeptos em euforia, em direção ao Zumbi dos Palmares, na avenida em festa.
A festa é de todos, é do povo, do Rio de Janeiro, do Brasil e também de todos os que torceram por esta equipa e pelo mister (do latim "ministerii est") que soube se colocar atrás da equipa, levado aos ombros pelos adeptos, com o melhor ataque em todas as competições, a melhor defesa e uma engrenagem sem distanciamento entre os jogadores.
"Mister, nós te amamos", diz a equipa no balneário. É merecido. Parabéns!