A onda populista da intolerância
O CDS segue a lógica mundial da direita, numa clivagem à extrema-direita, populista, conservadora, na maioria dos casos preconceituosa e em muitos deles autoritária. Porém, a diferença entre este e o Chega não é um imitar o outro, pois muitas das ideias e estratégias usadas hoje pelo partido de André Ventura já no passado tinham sido usadas por vários membros do CDS, embora de forma mais ou menos envergonhada ou até contida pelas direcções, sobretudo no poder. A única pequena e verdadeira diferença entre os dois vai ser o facto do CDS não se poder apresentar como um partido anti-sistema ou fora do sistema (que já foi no passado) sem renegar todas as lideranças pregressas.
Ainda assim, sendo até então um partido que congregava diversas correntes ideológicas e visões de mundo muitas vezes conflitantes, a partir de hoje morreu qualquer hipótese de defesa de um ideal democrata-cristão, que tenha por base a igualdade individual e a solidariedade social.
O discurso de vitória de Francisco Rodrigues dos Santos foi marcado por uma afirmação clara de ideias reaccionárias, contra a Constituição, homofóbicas, misóginas (patentes na ausência de mulheres na direção) e xenofobas. Não sei quem perderá terreno nesse espaço, se o Chega de Ventura, se o CDS de Chicão, mas desconfio que muito mais é o que os une, do que aquilo que os separa, sobretudo agora, depois de uma organização moderada do aliado natural, o PSD. Quem verdadeiramente vai perder é a democracia e a possibilidade de diálogo moderado dentro da sociedade portuguesa, onde a retórica populista e a visão de sociedade excludente parece estar a instalar-se paulatinamente nas brechas das desigualdades, da precariedade social e do preconceito.
Algo para o qual muito têm contribuído os apoios, financeiros e mediáticos, que ambas as figuras e narrativas conseguem reunir em torno de si, desde grupos de comunicação social, a empresários com interesses difusos, nacional ou internacionalmente.
Os democratas, incluindo aqueles que defendem o modelo atual de democracia liberal, mas também os sociais-democratas e os socialistas, estão a ser cercados por todos os lados, por uma onda de intolerância e populismo que não pode ser ignorada, sob pena de nos afogarmos na demagogia retórica que anseia por repetir os erros do passado. Esperemos que depois da tragédia que nos conduziu ao Holocausto, cuja libertação de Auschwitz se assinala hoje, estejamos, de facto, perante uma simples farsa.