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Vetores da Inutilidade

Poesia, Atualidade, Crítica, Opinião, Artes e Cultura. Um blog por João M. Pereirinha

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A demissão de Teich é um bom sinal?

Foto: Ueslei Marcelino/Reuters (22.abr.2020)

Pode ser que sim, pode ser que não. Nelson Teich não aguentou sequer um mês no governo e pediu demissão afirmando: "não vou manchar a minha história por causa da cloroquina". É o segundo ministro da saúde, no espaço de um mês, a abandonar a pasta no meio da Pandemia em confronto com Bolsonaro. Mas, por mais o nosso desejo seja acreditar que Bolsonaro está à beira do precipício, a verdade é mais complexa do que isso.

 

Além disso, mesmo que caia, nada indica que a política mude de facto. O vice-presidente, general Mourão, fez um extenso artigo defendendo a atuação do governo e ameaçando uma crise de “segurança” no país – o que pode ser uma nuvem de fumo – e culpando os governos estaduais e as outras autoridades pelo caos existente. Apesar de serem os únicos a implementar medidas de contenção e mitigação da pandemia, mesmo com a sabotagem do governo federal. Agora, sem ministro da saúde, novamente, na linha de sucessão estão dois militares e um terraplanista, Osmar Terra. Este último, há um mês e meio usava gráficos descontextualizados para afirmar que a quarentena aumenta a propagação do vírus. Algo tão grave que até o Twitter o censurou

 

Entretanto, as negociações com o “centrão” continuam, intensificadas com a queda de Moro e o inquérito que decorre no STF, sobre as tentativas de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal, o que pode levar à sua queda. Porém, a acontecer uma denúncia por crime comum (pela PGR e STF) ela terá que passar na Câmara dos Deputados, para só então provocar o seu afastamento automático durante 180 dias. E até ao momento, por mais indícios que haja, como o vídeo da reunião ministerial, onde isso parece evidente – além dos ataques de Weintraub e Damares aos governadores e STF – o processo requer ponderação, análise e tempo. E tempo é o que o Brasil não tem!

 

Atualmente, o Brasil tem mais de 14 mil mortos de Covid-19, com uma subnotificação de cerca de 9 vezes inferior aos casos reais, e um aumento que se aproxima das mil mortes diárias. A continuar assim, estamos perante uma carnificina que só piora a cada dia.

 

Por outro lado, enquanto vários estados e cidades começam a atingir o limite de ocupação de leitos (Amazonas, Pará, Ceará, Belo Horizonte, Maranhão, São Paulo e Rio), existem vários hospitais federais fechados, por falta de técnicos; a compra de 15 mil respiradores à China foi cancelada pelo ex-ministro da saúde; ontem Bolsonaro publicou uma Medida Provisória (inconstitucional) que isenta de responsabilidades os servidores que cometerem erros ou omissões no combate ao vírus; e insiste em impingir o tratamento por cloroquina ou hidroxicloroquina (o motivo da demissão de Teich), apesar de já se saber da ineficácia contra o coronavírus. Ao mesmo tempo que o país se torna no epicentro mundial da pandemia, o governo cria complicações até no pagamento do auxílio emergencial.

 

Portanto, neste momento, é difícil avaliar se a demissão de Nelson Teich é boa ou má. Pois, neste anti-governo, com os seus anti-ministros, a única coisa capaz de superar a obediência cega da ala militar que o apoia, é o fanatismo inconsequente daqueles que o seguem incondicionalmente. Pior do que um ministro que sucateava o SUS, e outro que defendia os interesses dos privados na saúde, é ter alguém que assine de cruz a política assassina, eugenista e genocida de Bolsonaro, crente das mesmas ilusões e teorias que o cercam, para bajular a sua megalomania narcisista e ânsia de poder, à imagem de Damares, Regina Duarte, Weintraub, ou Paulo Guedes (que atacou médicos e polícias para defender o congelamento salarial)

 

Por mais que queiramos ver a queda iminente de Bolsonaro, enquanto ela não vem temos que nos preparar para o pior, esperando o melhor. Como diz a música de Chico Buarque, “apesar de você/ amanhã há de ser/ outro dia/ você vai se dar mal”.

 

Foto: Ueslei Marcelino/Reuters (22/04/2020)