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Vetores da Inutilidade

Poesia, Atualidade, Crítica, Opinião, Artes e Cultura. Um blog por João M. Pereirinha

Vetores da Inutilidade

Poesia, Atualidade, Crítica, Opinião, Artes e Cultura. Um blog por João M. Pereirinha

DA UBER

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Eu não percebo qual é a dificuldade de resolução da questão e polémica envolventes da empresa "Uber" vs Taxistas. Talvez o primeiro problema foi ter-se constituído este binómio. Ainda assim, não custa nada fazer uma de duas coisas: ou se equipara o serviço da Uber, que na prática o é, ao serviço de transporte de passageiros, e a partir daí é obrigado a pagar todas as taxas, regulamentações, licenças, cursos, etc., que regulam os taxistas; ou se alivia a carga fiscal, reguladora e licenças sobre os taxistas. Para que daí se possa liquidar um dos principais factores, tanto de concorrência desleal, como de conflito, como também de salvaguarda dos direitos dos consumidores.

 

Posto isto, caímos num limbo que a discussão me parece mais instrumental do que propriamente de resolução, onde estão TODOS errados, embora todos possam ter razão.

 

Começando pelos consumidores, os quais eu, embora compreenda quer as queixas perante o sector, assim como a possível satisfação face ao serviço alternativo, não consigo entender, ainda assim, como aceitam ser transportados por quem não tem qualquer tipo de prova das suas aptidões ou competências para tal. Da mesma forma que, não basta a alguém ter um consultório para se auto-intitular de médico, é preciso mais do que a habilitação para conduzir para se ser um motorista profissional - pelo menos a lei assim o designa. Por outro lado, não basta à "Uber" afirmar-se como uma aplicação digital, pois o meio que eu utilizo para prestar um serviço não condiciona per si a actividade profissional em que me insiro, e neste caso são uma empresa que presta serviços de transportes. É tão absurda esta argumentação como agora começar a vender Kebab's por e-mail, sem licença de restauração, e afirmar que sou uma empresa de comunicação ou telemarketing... Por outro lado, os Taxistas ao aceitarem serem tão mal representados, só nos dão motivos, caso faltassem, se não para andar a pé e de Transportes Públicos, pelo menos para experimentar a "Uber". Visto que também não compreendo como é que alguém possa defender o monopólio de mercado, fazendo apologia a todas as suas piores práticas enquanto colectivo, como bater em pessoas, proibir empresas de actuar no sector, e ignorar todos os aspectos passiveis de melhoria dentro de si mesmo: como deixar de enganar clientes, parar de propor preços abusivos, deixar de controlar o terminal de saída dos aeroportos, etc.

 

Por fim, o Governo, a quem caberia a regulamentação do sector e a mediação das forças em choque dentro do mesmo, tem tido uma posição realmente embaraçosa. Pois, além de tomar partido imediato, acho inconcebível que pondere a renovação de frotas particulares através de uma linha de financiamento suportada pelo Estado, ou seja contribuintes. Para isso, estariam os Transportes Públicos (rodoviários, ferroviários, náuticos e [talvez] aéreos), cujas condições são deploráveis. A ser assim, o Executivo abre um precedente inédito e estapafúrdio, que nos permite reivindicar, amanhã, a renovação das frotas de pesados de mercadorias, que nunca tiveram qualquer tipo de apoio estatal.
 

25 DE ABRIL SEMPRE?!

 

 

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Há uns anos para cá que tenho marcado esta data com algum texto onde procure refletir sobre o seu significado, mas acima de tudo, sobre o significado polissémico que a Liberdade e a Democracia devem ter no nosso dia-a-dia. Não respirava, nem sequer era vivo quando os tanques entraram em Lisboa, as carabinas encheram os canos de cravos, ou quando começaram as rendições. Não tenho a dita, “autoridade”, de quem advoga ter “vivido” o dia. Nasci já depois das assembleias populares, depois dos verões quentes, da descolonização, do compadrio que tomou conta do Ensino Superior, depois das nacionalizações e privatizações e, por isso, depois da Constituição de 25 de Abril de 1975, que dá nome à rua onde vivi 20 anos, e das suas primeiras revisões. Nasci já só em Agosto de 1990. Mas duvido da narrativa daqueles que me querem convencer que o 25 de Abril ficou ali, preso, há 42 anos.

 

Para mim, o 25 de Abril deve ser uma data como o 1º de Maio, que mais do que celebração, deve ser também, e sobretudo, de luta e reivindicação. Como escrevi há 2 anos. Para a qual devíamos agendar manifestações, para as quais essa data abriu as portas da Liberdade, de ação e pensamento. Mas, sem esquecer que nada ficou feito ou pronto a 25 de abril de 1974. Pelo contrário, tudo ficou por fazer. E os dias e anos seguintes, controversos e conturbados, são prova dessa razão. Assim como os dias de hoje, quatro décadas depois, para aqueles que me atiram as culpas de nascer “depois da história”. Mas hoje, ainda há muito Abril por cumprir.

 

Em tanto, e muita coisa. Mas serei breve, que os tempos não aguentam a agonia da fugacidade. Mas falta cumprir-se, por exemplo, um Abril onde o trabalho qualificado não seja desprezado e mal pago, abaixo quer da inflação quer do investimento pessoal e social na Educação. Falta-nos a Educação que se consiga autónoma, forte, e essencialmente pluridisciplinar e multidisciplinar. Falta-nos a abertura dos partidos, tantos e muitos que advogam a si a posse de uma data que nunca fizeram cumprir internamente. Onde reina a opressão tirana da confluência de interesses, e a recompensa do compadrio. Falta quebrar esse muro de surdez, para que o Povo tenha uma palavra direta e decisiva sobre o rumo, quer da génese identitária, quer das políticas e prioridades, tanto dos partidos, como do Parlamento como do Governo, acompanhado e em diálogo com a Presidência.

 

Da mesma forma, que nos falta compreender que não há retrocessos históricos, e que, por mais que tentem massajar os factos, a verdade sobressai sobre qualquer narrativa ideológica ou maniqueísmo histórico, social ou económico. Falta cumprir-se um Abril onde, em vez de baionetas retóricas, haja cravos de confluência pelo interesse nacional, e não pelo assalto ao poder partidário e executivo. Falta-nos um Abril, onde cessem as acusações de parte a parte, e haja uma prioridade essencial e superior a qualquer diligência entre o mais radical neoliberal e o mais conservador comunista: o bem-estar da população, o desenvolvimento social, e um progresso subordinado às necessidades fundamentais da sociedade.

 

Enquanto isso, vou já varanda, onde vivo há 4 anos, e olho sobre a Praça 25 de Abril, e onde nunca vi uma celebração, uma manifestação, nem sequer um piquenique nos jardins envolventes da fonte central que, hoje, está desligada, suja e meio abandonada.

 

IMAGEM: © Eduardo Gajeiro, 25 de Abril de 1974, Capitão Salgueiro Maia no Largo do Carmo fala com a população.