Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Vetores da Inutilidade

Poesia, Atualidade, Crítica, Opinião, Artes e Cultura. Um blog por João M. Pereirinha

Vetores da Inutilidade

Poesia, Atualidade, Crítica, Opinião, Artes e Cultura. Um blog por João M. Pereirinha

Talvez o mundo vá acabar












 

        Pondo desde já de parte todas as teorias de conspiração sobre o onze de Setembro e as teorias maias de que o mundo irá acabar em Dezembro de dois mil e doze, de facto, e vendo bem o que se passa à minha volta, acho que o mundo vai acabar mas ninguém me avisou.

 

        Basta abrir a janela de manhã p’ra pensar “anda tudo tresloucado” (porque atrás da minha casa onde era p’ra nascer um parque infantil estão a construir garagens para os moradores do prédio que têm opção de compra). Mas depois de pensar isto ligo a tv e vejo coisas totalmente surreais neste nosso “Portugal dos pequeninos”, que p’los vistos nem de todos os pequeninos.

 

        Estou a falar neste caso, obviamente, da menina Alexandra. Como devem saber, depois de passados mais de quatro anos entregue a uma família de acolhimento por a mãe biológica, emigrante russa em Portugal, não reunir de facto condições psicológicas nem monetárias adequadas para cuidar da mesma. Acontece que passados estes anos todos essa mesma mãe entra em conflito judicial com a família de acolhimento, com a qual mantinha uma relação estável, segundo os mesmos, recorrendo-se destes por diversas ocasiões, pela custódia da criança. A primeira batalha, no tribunal de Barcelos, foi ganha pelos pais afectivos. Tribunal tem em linha de conta para esta decisão o choque que poderia significar para a criança a ida para a Rússia com a mãe; reconhece os comportamentos desviantes da mãe, os divórcios, a filha que não vê à seis anos etc.; que a criança “só muito recentemente está a conseguir ver a mãe de forma positiva”; e que a progenitora não “forneceu qualquer garantia que tem para a sua filha e até para si, um projecto de vida (…) como não indicou que está disposta a sacrificar os seus interesses, por mais legítimos que sejam, em prol do bem estar da filha”.

 

        Acontece que, como já disse, vivemos em Portugal, e é isso que não quero que se esqueçam. E como assim é, tudo é possível. Quem ganha uma batalha não ganha a guerra e vice-versa, como tal a mão biológica recorreu então a outro tribunal, de Guimarães, desta decisão. Uma coisa que todos os acusados ou acusadores no nosso país adoram fazer. E “voilà” o inesperado acontece. Dois tribunais portugueses, sobre a mesma situação, a contradizerem-se brutalmente. O tribunal de Guimarães, além de contradizer todas as perspectivas do tribunal de Barcelos e por de parte toda e qualquer análise psicológica, acrescenta ainda ao caso que “só por laxismo ou desatenção se poderia deferir a confiança à ama em questão, pois não transparece dos autos um quadro pessoal e psicológico suficientemente equilibrado que justifique tal escolha”. E assim foi, uma criança de seis anos é entregue às mãos da mãe biológica e partem as duas para a Rússia, depois de esta a ter abandonado aos dezassete meses, sob um circo mediático e após ter criado vínculos e laços afectivos, durante vários anos, os mais importantes para este feito, com uma outra família. Nem sequer é preciso ter uma singela iniciação em psicologia, como eu, para perceber, como todos os psicólogos o afirmam, que a criança vai e está já a sofrer graves traumas com todo este caso. Mas é este o “Portugalito” que temos, o que acontece agora é que perderam-se todas as hipóteses de regresso da criança pelo facto de esta se encontrar agora num país estrangeiro e fora da U.E..

 

        No entanto, eu insisto e penso que não pode ser verdade e então por impulso, mudo de canal. Mudo e vejo, o que os jornalistas do momento apelidaram de “manifestação espontânea” às portas de uma escola. Até aí tudo normal, com o avançar da notícia, ouço “governo fascista, a morte do artista”, grita a multidão de alunos em causa. Começo a ficar confuso, a palavra “fascismo” está relacionada com a ditadura de Mussolini, que tinha ligações de direita, o nosso governo é de centro esquerda, não podia ser cá de certo. Mas era, era na escola secundária artística profissional António Arroio, em Lisboa. Ao que parece o governo deslocou-se às instalações da mesma para celebrar os contratos de renovação das instalações da escola e os alunos estavam a manifestar-se ao que parece porque não queriam as obras na mesma mas antes sim a aquisição de novos materiais. É mesmo de “porteguesinho”, cuspir na mão de quem nos dá de comer. Perplexo com toda esta situação apenas gostava que os nossos futuros artistas fossem, no mínimo, um pouco mais cultos, pois de orgulho, passam a ser a vergonha do povo.

 

        Mas não perco a esperança e à noite, voltando a casa depois de ter passeado pela calçada, e mais calçada, e parece que calçada é mesmo a maior obra publica do meu concelho, só faltando já entrar pla casa das pessoas a dentro, ligo novamente a tv. E vejo mais uma peixaria em horário nobre. Desta vez uma luta entre Manuela Moura Guedes e o seu convidado Marinho Pinto onde este lhe diz curtas e grossas a cerca do seu (dela) profissionalismo e pender jornalístico,  à imagem do que já tinha feito o primeiro ministro em Abril numa entrevista à RTP onde apelidava o jornal de sexta feira da TVI de “um jornal-travestido”.

 

        Bem, metendo isto tudo no contexto onde o país e o mundo atravessam uma das piores crises financeiras de sempre, onde as reservas de petróleo escasseiam cada vez mais, onde tem deixado de chover no inverno e os verões são cada vez mais rigorosos. Depois de tudo isto, de ver quase todos os nossos sistemas falidos e viciados, não me querem dizer que o mundo vai acabar? Bem talvez não, mas que está perto está, não de acabar no sentido que muitos de vocês estarão a pensar, mas sim num sentido de falência social.

 

        O que é preciso é uma renovação de mentalidades, pessoas, sistemas, ciclos. Não sei se o mundo vai acabar ou não ou se alguém irá impedir tal desfecho, no entanto, chamem-me louco, mas vou continuar a acompanhar o noticiário.