"Dura lex, sed lex"
Concurso sa Secção de Fotografia da Associação Académica de Coimbra, com tema "Dura praxis, sed praxis".
Esta citação aqui abaixo não é assim tão longa, muito menos para quem lhe diz respeito, e merece toda a referência. É um texto pertencente a uma pessoa que muito admiro, com quem aprendo, e muito, e que raramente vejo a falar do que não sabe sem o reconhecer a priori. Por isso, e tudo mais, merece a consideração pelas palavras que profere, quanto mais que não fosse pelo que já viu, viveu e por todos os seus anos de casa.
Podemos ler pontos certeiros e qualquer um o pode confirmar e aferir facilmente, e volto a repetir, principalmente aos que a causa diz respeito. Aos supostos letrados, doutores e senhores que tudo-lo-podem e tudo-lo-sabem em matérias e questão de achincalhamento, rebaixamento e chacina de direitos. Tendo como argumento uma causa totalmente contrária aos atos e uma vivência distorcida e totalmente contrária da ideia de Academia, integração e luta pela igualdade de direitos, forjada pelos corredores de toda a Universidade à custa de muita bastonada, nodoa negra, noites de cativeiro e serviço militar cumprido nas fileiras de mato. Mas nunca, em qualquer momento, pondo em causa o saber, a integridade e, muito menos, promovendoo laxismo contra o qual tanto se lutava.
Ou se muda alguma coisa, ao menos nas mentalidades, ou continuamos a formar crianças que pouco mais aprendem do que: "brincar é bom"; "sair ainda melhor"; "estar drogado é topo"; "faltar às aulas dá estatuto"; "hoje levo para dar amanhã"; "o outro aponta e eu copio"; "levei cábulas e passei"; "há dez anos que estou na faculdade, já ninguém manda mais que eu". Um ambiente pior, muitas vezes, que um campo de treino militar (a quem reconheço muito mais mérito) e promotor de uma vivência meramente clubística, de facilitismo e déspota, reduzindo muitas vezes os indivíduos a uma burrice, alienação e infantilidade ainda mais intrínseca do que quando chegaram ao campus.
Se o ensino secundário ainda funciona minimamente, e se estás na universidade, logo sabes ler, então lê e analisa:
"De novo às voltas com o problema das praxes académicas. Não que representem uma dificuldade para quem, nos ambientes universitários, delas fazem – até há pouco durante algumas semanas, agora o ano letivo inteiro – o eixo das suas vidas. Pelo contrário, aparentemente essas pessoas até se divertem, naquela maneira muito própria e um tanto pobre de se divertirem. Mas porque para a maioria dos cidadãos, que as observam de fora como vestígios exóticos de uma época e de um mundo que não entendem bem, são fator de perturbação. As razões que as impõem não se prendem, no entanto, com o lado mais ou menos folclórico da «festa permanente» que lhes está associada. Na raiz implicam um recreio muitas vezes legítimo, e afinal nem todos temos o dever de achar recreativas as mesmas coisas. Relacionam-se antes com três circunstâncias sobre os quais podemos alinhar umas ideias.
A primeira refere-se à apresentação de tais práticas como socialmente integradoras. São-no de facto, mas integrando os jovens novatos em ações aviltantes e sexistas, determinadas por práticas hierarquizantes e resistentes à mudança, impostas geralmente pela coacção e pelo medo. A segunda circunstância liga-se às recentes alterações das manifestações praxísticas, que se têm expandido, invadindo espaços de trabalho, perturbando agora as próprias aulas e tempos letivos, e tomando formas antes vedadas pelos seus próprios códigos. São estes abusos, alguns com marcas de agressividade e violência, verbal ou mesmo física, consentida ou não, que foram há tempo objeto de medidas restritivas por parte de algumas autoridades académicas. Finalmente, a terceira prende-se com o tempo concreto em que vivemos e que, mais do que nunca, requer a coesão, o contributo ativo e a ousadia crítica dos jovens. Em espacial dos universitários, tradicionalmente (tradicionalmente, é de insistir) ligados à crítica social e a causas difíceis mas necessárias. Que pode pensar, neste momento tão dramático que estamos a viver – e que atinge brutalmente a maioria dos estudantes e as suas famílias – quem olha, como única atividade visível no teatro social, tais atos de estúrdia sem sentido e de exibição de estatuto? Estatuto que além do mais já não existe.
Claro que é injusto generalizar. Sendo uma minoria, existem muitos alunos universitários com consciência crítica que não atribuem importância alguma a este folclore, que dele até se distanciam, que sobre ele ironizam, que correndo alguns riscos se lhe opõem. E são muitos mais aqueles que, encolhendo os ombros, apenas aceitam o seu lado mais ocasional e simbólico. Mas é preocupante perceber o modo como todos estes se têm vindo a alhear dos organismos associativos e das atividades coletivas mais especificamente académicas, seguindo um tanto à margem da vida universitária e cedendo o lugar na representação social do estudante às minorias ruidosas, geralmente ignaras e vazias de perspectivas ou de objetivos, em alguns casos tocando a delinquência, que andam a confundir as universidades e as cidades que as acolhem com parques de diversões regados a cerveja."
Em: BEBIANO, Rui, Ainda e ainda as praxes académicas de "A Terceira Noite", http://aterceiranoite.org/2012/04/01/ainda-e-ainda/